domingo, 12 de março de 2017

HUMANIDADE DESCARTÁVEL



                          Mudanças, evolução, modernidade, pós-modernidade, tecnologias, redes sociais, celulares, correria, estresse, violência, suicídios.
                         Marcas do tempo. Desse tempo. Do tempo de todos os que permanecem vivos.
As mulheres e os médicos não têm mais tempo de esperar que os bebês achem seu tempo de vir ao mundo e sua retirada da barriga da mãe já é marcada nas primeiras consultas do pré-natal.
                        Mesmo quando a mãe não trabalha, assim que possível o bebê já é entregue a uma creche, escolinha, depósito de bebês, seja o nome que derem a quem se encarrega de apresentar o mundo àqueles serzinhos ainda tão pequenos. E quanto mais tempo as crianças permanecerem na escola, mais chances de harmonia terão em seus lares e mais tempo de mexer no celular seus pais terão. Não faz muito tempo que as casas não tinham sequer televisão... e como as crianças brincavam! E como liam!
                        As consultas escolares são feitas nos celulares dos pais e o professor universal se chama Google. Nada de enciclopédias, de folhear livros, de consultar em diversas fontes. Ao invés de desenhos, páginas impressas e muitos joguinhos eletrônicos lançando sua luz perigosa nos olhos jovens.
                       Antes, quase todas as casas tinham um velho, um idoso ou idosa para ser cuidado pela família. Agora, lugar de velho é no asilo, ou que nome deem a essas casas onde eles passam o dia suspirando, silenciosos e tristes ao lado de outros velhos. Se for doente, então, irá imediatamente para uma clínica, pois ninguém tem tempo de atender suas necessidades. Depois de morto, os parentes, que não se dispuseram a dedicar seu tempo livre a cuidar do idoso, muitas vezes se engalfinham em brigas feias pela herança do pobre coitado.
                       Quando os casamentos terminam, os companheiros são logo substituídos e os filhos vivem se equilibrando entre dois ou mais lares e tentando se adaptar. “A fila anda” é o jargão mais usado, recheado de insensatez e irresponsabilidade, como se se tratasse de uma linha da produção onde fossem sendo descartados os produtos com defeito, deixando passar só os perfeitos. Pior são os casos de quem não aceita o fim do relacionamento e decide matar quem o abandonou e se matar também. Isso quando não mata os filhos e parentes da vítima junto. Donos da vida e da morte portanto.
                       Os mortos eram velados nas salas de suas casas e um laço de veludo preto era colocado no lado de fora, anunciando que ali havia um velório e que os vizinhos e os passantes deviam respeitosamente manter silêncio nas redondezas. Depois, passaram a ser velados nas capelas, uma vez que muita gente mora em apartamentos e outros não querem aglomerações ou lembranças tristes na sua casa. Agora, melhor logo transformar tudo em cinzas, jogá-las em algum lugar e sumir com os vestígios daquele ente nem tão querido, economizando as visitas e flores ao cemitério.
                       Assim, o nascer e o morrer já não são naturais e sim determinados por essa humanidade cada vez mais descartável.
                       Tudo o que foi dito não são críticas e não se destinam especificamente a ninguém. São constatações de quem, além de viver, passa o tempo a pensar a vida.




2 comentários:

Roselia Bezerra disse...

Bom dia, querida Maria Luíza!
É impressionante como descreveu a real situação dos idosos bem idosos...
É lamentável que os bondosos fiquem sós!
Tão bom ter uma família por perto!
Bjm muito fraterno

Luiz Eurico disse...

Verdades duras, mas, verdades...